Ele deve trilhar uma carreira centrada no humanismo, precisa valorizar e gostar de gente
*Antonio Carlos Lopes
A formação em medicina e a própria prática médica sofrem um desvio gravíssimo no Brasil. Trata-se de um campo da ciência que requer, obrigatoriamente, uma visão humanística dos pacientes, além de profunda clareza de seu papel social.
A formação em medicina e a própria prática médica sofrem um desvio gravíssimo no Brasil. Trata-se de um campo da ciência que requer, obrigatoriamente, uma visão humanística dos pacientes, além de profunda clareza de seu papel social.
Hoje, certas universidades, tanto públicas quanto privadas, parecem se contentar em repassar conteúdos científicos, possuir estrutura adequada e corpo docente de excelência.
Não é o bastante. O envolvimento com ensino, assistência e pesquisa são insuficientes enquanto entrega, pois cabe a essas instituições uma missão muito mais complexa.
E olha que comecei citando os melhores exemplos. Há ainda diversas faculdades de Medicina que cobram mensalidades caríssimas, funcionando sem hospital escola, com corpo docente de capacitação contestável e possuem falhas na grade pedagógica. Certamente são responsáveis por parcela das mazelas da saúde do País.
Quando pensamos em um médico realmente capacitado, temos em mente um profissional que vai bem além do conhecimento técnico. Ele deve trilhar uma carreira centrada no humanismo, precisa valorizar e gostar de gente. Na medicina, aliás, o amor ao próximo é o alicerce da boa prática.
Essa visão cidadã está em falta no pacote saúde oferecido pelo aparelho formador aos futuros médicos. Isso porque a maiores dos cursos possui visão puramente mercantilista. Desculpe a sinceridade, mas é obrigação de qualquer instituição de ensino em medicina formar profissionais sem preconceitos e com amor verdadeiro ao exercício da profissão e aos pacientes. As grandes intervenções médicas dependem demais do humanismo.
Assim, faz-se indispensável que essas escolas mudem rapidamente de foco. Uma proposta de medicina motivada exclusivamente na razão do lucro tende a produzir excesso de exames, gastos desnecessários, o agravamento de doenças e até tragédias, com a perda de vidas humanas.
O bom médico não é fruto do acaso ou de um dom. É indispensável ensinar também conduta humana, na qual a relação médico-paciente é baseada na confiança e respeito, e não somente um atendimento frio e científico.
Medicina, digo sempre, não é apenas estudar a ação de substâncias no organismo, verificar o funcionamento de órgãos ou realizar cortes cirúrgicos com precisão, é muito mais. Reafirmo: o médico deve amar a profissão e ter em mente que seu foco não são doenças e sim os doentes.
Enquanto a quantidade de profissionais for o centro da discussão, e não a qualidade da formação, teremos médicos que enxergam seu trabalho sob ótica simplória: os pacientes para eles se tornam simples números de quartos ou clientes de planos de saúde A ou B.
A saúde da população deve ser levada mais a sério, o médico deve saber o peso da responsabilidade que tem nas mãos. E isso também é assunto a ser levado a sério e com consequência pelas faculdades brasileiras.
*Antonio Carlos Lopes, presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica