A confiança não deve dispensar facilidades, assim como complexo não é sinônimo de seguro
Um dos desafios das empresas para a retomada do crescimento na nova realidade e depois da presente pandemia é estabelecer novos paradigmas de confiança. O aumento do rastreamento de dados epidemiológicos e da saúde pessoal provocado pela covid-19 e o crescimento dos meios digitais no trabalho, comércio e serviços durante o período de quarentena e o expressivo aumento de colaboradores em trabalho remoto (home office) expuseram mais as informações dos cidadãos e ampliaram o foco na segurança cibernética. Há mais cuidado e ceticismo. Portanto, é preponderante que a privacidade, mais do que nunca, seja tratada como direito e não artigo de luxo.
O universo virtual e o crescimento correspondente aos riscos de fake everything (falsificar tudo) estão fazendo com que a confiança assuma novos significados e mais importância. Alteram-se os parâmetros em quem, o que e como confiamos. Assim, torna-se necessário prover a validação de produtos físicos e digitais e das cadeias de suprimentos, dando muita ênfase a credibilidade, criando tranquilidade para clientes e colaboradores, com total transparência dos procedimentos de saúde e segurança e processos auditáveis.
Nesse contexto, a adoção dos dispositivos da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), em vigor no Brasil, ganha ainda mais importância, assim como o conhecimento do arcabouço legal correlato de outros países e regiões, como o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados da União Europeia (GDPR), considerando que o digital não tem fronteiras. É, ainda, fundamental instituir práticas rigorosas de segurança cibernética para proporcionar mais conforto e confiança aos consumidores e parceiros comerciais na interação com as empresas.
A confiança não deve dispensar facilidades, assim como complexo não é sinônimo de seguro. É pertinente oferecer aos clientes acesso às suas informações e demais direitos previstos em Lei e tratá-las como um ativo para o negócio, com adequado investimento na infraestrutura de proteção de dados.
A credibilidade, segurança e eficácia dos processos são decisivos neste momento tão inusitado da economia. Para isso, as empresas devem avaliar internamente e responder a perguntas cruciais: os colaboradores confiam nos seus empregadores no que tange às decisões de sobre o tratamento de dados e estão colocando a segurança dos funcionários e do trabalho à frente dos lucros?; como estão permitindo mudanças para um gerenciamento baseado em resultados?; o home office continuará?; mostrou-se eficiente, responsável e assertivo por parte dos colaboradores?; há uma cultura inovadora em vigor para capacitar a empresa a encontrar novas maneiras de se adaptar à nova realidade, fomentando a confiança de que ela pode atingir seu propósito e atender bem seus clientes, com segurança e credibilidade?; e os mecanismos de governança são adequados para permitir tomadas de decisões rápidas para adaptação à realidade imposta pela pandemia dentro dos aspectos regulatórios?
A propósito: essas podem não ser questões de múltipla escolha. A maneira como cada empresa as responderá em termos práticos será crucial para determinar como e em que ritmo se desenvolve nos meios digitais e adaptação à nova realidade.
André Coutinho é sócio-líder de Advisory da KPMG no Brasil e na América do Sul e Leandro Augusto é sócio-líder de segurança cibernética da KPMG.