Mais de cem crianças ficaram órfãs e quatro professores estão entre as 272 vítimas fatais
Record TV
Redação/HourpressVítimas sendo resgatadas do lamaçal provocado pelo rompimento da barragem
No dia do Professor (15/10), é importante resgatar o papel-chave destes profissionais nas escolas de Brumadinho (MG) e da região após o rompimento da barragem de rejeitos de mineração da Vale. Depois da tragédia-crime, ocorrida em 25 de janeiro de 2019, professores e alunos passaram a ter de lidar, diariamente, com uma realidade inimaginável. Entre tantas perdas provocadas pela ruptura da barragem, mais de cem crianças ficaram órfãs e quatro professores estão entre as 272 vítimas fatais.
Os professores eram Sirlei de Brito, que também era advogada e secretária municipal de Desenvolvimento Social de Brumadinho; Edimar da Conceição de Melo Sales, docente do curso técnico de mineração da Faculdade ASA de Brumadinho; Warley Lopes Moreira, que era engenheiro master da Engenharia de Manutenção da Vale no momento do rompimento da barragem e foi professor do Centro Universitário Una e do Cefet-MG; e Márcio Mascarenhas, professor de inglês e dono da Pousada Nova Estância.
A partir da tragédia-crime, as escolas municipais da cidade passaram a contar com psicólogos para acompanhar os alunos por conta de problemas emocionais enfrentados por eles e suas famílias, seguindo uma decisão da secretaria municipal de Educação. De acordo com a diretora da Escola Municipal Padre Machado, Alice Porfírio, os professores têm de enfrentar até hoje diversos desafios em suas rotinas escolares após o rompimento da barragem, o que demanda um apoio especial a seus alunos, cotidianamente.
Acordo
“São alunos carentes que perderam familiares ou pessoas queridas. São alunos que veem as pessoas sofrerem e que estão emocionalmente abalados. A partir da data da tragédia, muitos choram com frequência, passam por situações de ansiedade e pânico”, afirmou Alice. Nesse contexto, os educadores também foram afetados pela tragédia, de acordo com a diretora da Escola Municipal Padre Vicente Assunção, Celma Ferreira.
“Todos nós ficamos com problemas emocionais e psicológicos, pois perdemos amigos, familiares e vizinhos de uma maneira muito brusca. Mas nós educadores tivemos que passar por cima de nossas dores e lutos para acolher e ajudar nossos alunos que estavam sofrendo. Tivemos que ser fortes para tentar aliviar a tristeza deles. A escola proporcionou aos alunos um ambiente de suporte e apoio ao drama vivido por toda população de Brumadinho”, afirmou Celma. Segundo ela, em busca do bem-estar da comunidade escolar as iniciativas de acolhimento e afeto nas escolas ganharam ainda mais relevância.
Escola: um lugar acolhimento
A supervisora pedagógica da Escola Municipal Nilza de Lima Sales, Cesária Clarice Mendes Carmo, contou que, no ano da ruptura da barragem, a unidade de ensino transformou-se em um local de “conversa” para apoiar estudantes, familiares e funcionários. Segundo ela, a escola, localizada no distrito de Conceição de Itaguá, era uma das que tinha o maior número de alunos com parentes entre as 272 vítimas da tragédia-crime.
Segundo Cesária, “a escola teve um papel primordial, foi refúgio, lugar de desabafo, de entendimento”. “Na faculdade, aprendemos que temos de falar para expor conteúdo. Mas, naquele momento, tivemos de aprender a escutar mais e falar menos, ouvindo com o coração para se colocar no lugar do outro”, afirmou Cesária, que também é professora, atuando no projeto de reforço escolar. O tio de Cesária, Valdeci de Souza Medeiros, está entre as 272 vítimas.
Após a tragédia-crime, o Sistema Pedagógico Semear, unidade privada de ensino, recebeu uma grande demanda de matrículas de estudantes que perderem familiares, segundo a diretora e proprietária do Semear, Tânia Aparecida Campos Martins. Atualmente, 40 órfãos da tragédia estudam na escola, o que corresponde a cerca de 10% do total de estudantes do Semear. Em 2019, o Semear passou a atuar de forma a acolher os estudantes e parentes, promovendo dinâmicas lúdicas, como, por exemplo, apresentações teatrais e shows, além de encontros para mães e pais. Até hoje também é desenvolvido o projeto “Fortalecendo Laços” para apoiar as equipes de servidores e professores, que também perderam familiares no rompimento da barragem.
Exemplo
Segundo Tânia, as palavras “mãe e pai” passaram a ser evitadas pelos professores de modo a respeitar os desafios emocionais de crianças órfãs em datas festivas e durantes as aulas. No lugar, passou-se a utilizar a palavra “família” de modo a agregar todos os estudantes. “É importante o reconhecimento dos professores, ter gratidão por estes profissionais que se doam tanto. Professores são referência e exemplo”, declarou Tânia.
A Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem Mina Córrego do Feijão (AVABRUM), idealizadora do Projeto Legado de Brumadinho, une-se às homenagens aos professores. Segundo Edi Aparecida Tavares Pinto, do conselho fiscal da diretoria da AVABRUM, é importante expressar, “na data em que se comemora o Dia do Professor, os nossos mais profundos agradecimentos pela forma como cuidaram e cuidam das dores latentes nos corações das nossas crianças e adolescentes que perderam entes queridos”.
“Perder alguém que amamos já traz muito sofrimento e dor, e, da forma como se deu em Brumadinho, estes sentimentos se acentuaram significativamente, trazendo consequências avassaladoras de ordem psicológica e emocional. Neste contexto, a atenção redobrada, o acolhimento e o amor que os professores dedicaram aos alunos impactados foi de suma importância para aliviar suas dores”, afirmou Edi, que é funcionária da Secretaria de Educação de Brumadinho e diretora de cursos técnicos da Faculdade ASA, localizada na cidade. Ela conta que foi professora durante muitos anos e considera que estes profissionais exercem “um papel social de extrema grandeza”.
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Projeto realizado com recursos destinados pelo Comitê Gestor do Dano Moral Coletivo pago a título de indenização social pelo rompimento da Barragem em Brumadinho em 25/01/2019, que ceifou 272 vidas.